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25/09/2015

Sem estrelas no céu escuro


 Em uma galáxia longínqua, havia esse planeta que em um passado muito, muito remoto, chamavam-a de "Terra". No período geológico Holoceno do Cenozoico, destacou-se o Homo Sapiens, da família dos hominídeos.

 Povos e impérios surgiram e caíram. Culturas globalizaram-se. O mundo inteiro tornou-se uma civilização global, composta pelos nossos antepassados humanos. A mentalidade arcaica da sociedade daqueles tempos, no entanto, foram altamente danosas. Poluição, desmatamento, guerras e ganância, extinção em massa de espécies, exploração de recursos naturais. Ações que conforme décadas se passaram tornaram-se insustentáveis para o equilíbrio do planeta.

 Nossos ancestrais não mediram suas consequências em ferir ininterruptamente o ecossistema da qual tanto dependiam. De natureza dúbia, os hominídeos da época foram, no entanto, capazes de superar suas atitudes de caráter questionável.

 Fomos capazes de aventurarmos-nos pelas estrelas. Séculos de conhecimento e ciência aliados à curiosidade foram aplicados à alma do espírito aventureiro e desafiador do homem. Lançamo-nos rumo ao céu noturno. A colonização do espaço sideral era, em primeira instância, necessária a longo prazo.

 O planeta que uma vez os humanos habitaram, chamado "Terra", não mais era um lar sustentável para a demanda da espécie. O aquecimento global havia tornado-se irreversível. A tecnologia para conter as ações prejudiciais ao habitat natural contrastavam com a ambição e a vaidade humana. Mesmo se eles tivessem tornado-se sustentáveis; o Sol, estrela hospedeira do planeta, iria esgotar o hidrogênio em seu núcleo, explodindo em alguns bilhões de anos. O que de fato aconteceu. Nunca jamais existiu tecnologia capaz de impedir esse processo. A estadia permanente dos humanos da Terra seria impossível de qualquer forma.

 Colonizar exoplanetas habitáveis em sistemas estelares distantes era necessário. Na infâmia de nosso antropocentrismo, a perpetuação da espécie humana estava intrínseca à sua capacidade tecnológica de lentamente ir se instalando em outros mundos. 

 Então, através das eras, os homens navegaram pelos mares negros do universo, colonizaram novos planetas, abandonando planetas condenados, atravessando galáxias, enfrentando mortes em massa por pousar no planeta errado, e entrando em guerra com outras civilizações intergalácticas... mas isso são histórias pra um outro dia.

 Nessa escala cosmológica, milhões de estrelas morreram. Outras estrelas nascem dos remanescentes químicos de outras estrelas que um dia explodiram em uma violenta, brilhante a catastrófica explosão. Essa lei imutável seguiu-se por bilhões de anos, permitindo que gerações de hominídeos perpetuassem sua existência através das eras, instalando-se em novos planetas por mais tempo com o emprego de tecnologias e políticas mais sustentáveis.

 Nas brumas do tempo-espaço sideral, porém, nenhuma estrela vive eternamente. A antiga hospedeira Sol morreu há muitos éons. E muitas outras hospedeiras estelares tiveram o mesmo fim através dos bilhões de anos. O Homo Sapiens, em sua sábia virtude, soube sempre prever a data da morte de sua estrela hospedeira, a fim de planejar-se rumo à outras terras longínquas do espaço.

 Após essa longa jornada cósmica, somos uma espécie completamente diferente. A evolução nunca pára. A transmutação celeste é infinita. Temos a lucidez de estarmos a mercê das leis da natureza. Nenhuma estrela vive eternamente, e com a ascensão da velocidade de expansão do universo, a matéria tornou-se mais condensada, dispersa e, sobretudo, mais fria conforme os (bilhões) de anos.

 Em nosso atual planeta, nossa estrela em breve morrerá.

 É hora de partir novamente. Com a condenação do nosso próprio terreno celeste, decretamos a vez de evacuar mais uma vez para o infinito cosmos em destino a uma nova estrela que comportasse nossa espécie. A humanidade destrava os portões de sua casa em busca de um novo lar.

 No imenso abraço do firmamento, a escuridão atravessa o que antes nos era um lar propício à vida. Embarcamos em novas terras cósmicas. Em alguns milhares de anos, nosso planeta estará em um banho mortal de radiação pela sua estrela hospedeira em fase de colapso, tornando-a estéril para a vida.

 Nenhuma estrela vive eternamente. A matéria condensada, dispersa e fria dissipou-se junto com a expansão das texturas do espaço tempo. O universo traça seus finais momentos. Há muitas eras não vislumbramos o céu à noite com o mesmo esplendor de nossos antepassados hominídeos na Terra. Em nosso último planeta, não tínhamos mais estrelas no céu noturno. O que aconteceu com todas as estrelas?

 Nós, como espécie, no nosso atual estado nômade celestial, parecemos não termos um novo palco planetário para poder respirar o oxigênio de sua atmosfera. Porque o oxigênio está disperso e frio, junto com todos os outros gases e materiais essenciais para o desenvolvimento de novas estrelas, planetas e condições de abrigo à vida.

 Somos exploradores do universo. Navegamos nos mares negros siderais por bilhões de anos, dando continuidade à nossa espécie em novos planetas, em novas galáxias, em longínquos cantos do cosmos.

 Conforme os aeons cósmicos transitaram, no entanto, menos estrelas eram visíveis no firmamento de nossas moradas planetárias.

 Estamos em busca de uma estrela. Uma estrela que talvez possa ser eterna, com um planeta em sua órbita, capaz de nos abrigar confortavelmente. Mas o oceano cósmico não nos pisca nenhuma distante luz, nem mesmo fraca o suficiente para ser detectada pelo mais poderoso telescópio.

 A última estrela parece estar morta, e o universo escuro como a mais sombria noite. Não nos parece ter sido dado outra chance nos últimos respiros do universo. Nossa sonda mãe agora circunavega as margens de um espaço em seus momentos finais.

 Estamos a procura de um novo lar, mas o universo não é mais como antes. As estrelas que antes existiam morreram, e seus gases e matéria não mais foram capazes de formar novas estrelas e planetas. As galáxias estão apagando, como holofotes de um palco teatral.

 Quando a última luz apagar, não terão aplausos.

 O espetáculo chegou ao fim. Acredito que nossa jornada acaba aqui. Juntos em um abraço mortal, até nossa gélida respiração final, vagaremos diante das marés negras, calmas e estáticas... eternamente no céu escuro sem estrelas