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17/01/2012

O primeiro abraço que dei numa privada


Nosso primeiro porre. Inesquecível, né? O meu também espero que nunca o esqueça, pois é algo que eu espero que não se repita. Pelo o menos não com muita frequência... não sou muito fã do estilo Charlie Harper da vida. Exceto pela parte das mulheres e dinheiro.

 Meu primeiro porre foi há pouco mais de duas semanas. Ou seja, é isso mesmo. Meu primeiro porre foi no réveillon, na virada de ano pra 2012. Comecei o ano dignamente: com muitas 2000 e doses. Tá, essa foi ruim.

 Porém lá estava eu, sentado à mesa do computador, escolhendo criteriosamente as músicas da playlist que iria tocar durante a noite inteira. Como todos da minha família são exímios headbangers, obviamente coloquei somente rock e heavy metal, desde músicas mais melódicas até vocais guturais e baterias com pedal duplo. Como passaríamos o réveillon em família e com amigos do meu irmão, igualmente honráveis adoradores do metal, o que não faltaria na festa era cabelos longos. E as músicas pesadas foram um fator determinante para o meu primeiro porre. Explicarei o por quê mais abaixo.

 Lá estávamos nós, comendo churrasco, aproveitando as delícias assadas na churrasqueira envelhecida pela oxidação e meu pai a cargo de ser o churrasqueiro, como já é de praxe. Os amigos metalheads do meu irmão já estavam todos lá, juntamente com meu primo, mãe, pai, tios e alguma música aleatória do Testament rolando ao fundo. Sutilmente eu já estava bebendo, e quando menos notei, já estava na minha terceira latinha de Budweiser. Estava levemente estonteado.

 A essa altura, eu já me encontrava bebendo uma lata de Skol depois de quatro latas de Budweiser. E isso que eu estava evitando as demais bebidas alcoólicas que estavam inclusas na festa, das quais eram uísque, batidas, energéticos e um líquido azul misterioso que batizamos carinhosamente de Sangue De Smurf. E enquanto eu bebia, filmava os amigos do meu irmão - e o próprio - jogando Drinking Game. Mas isso não é só. Era um Drinking Game com memes da internet. Mais especificamente esses rostos idiotas que aparecem em milhares de tirinhas em milhares de blogs pela interwebz. Ou seja: o objetivo do jogo era chegar ao final das casas jogando o dado e bebendo doses de uísque - e conforme determinado pela casa em que o jogador cai - ou qualquer bebida de conveniência de todos os jogadores. E de preferência sem vomitar em cima de todo mundo.

era exatamente isso aí
 Sim. Praticamente todos estavam jogando. Eu, como já disse, estava somente a filmar. Mas um pontapé no destino me obrigou á ir ao banheiro despejar os efeitos do álcool na privada. Sim. Não, não fui vomitar. Fui urinar duas, três vezes... e enquanto realizava o ato mijatório deixara nas mãos de alguém que estava do meu lado cuidando dos dotes da filmagem daquela bagunça toda. No entanto, após a terceira vez em que eu fui mijar, não filmei mais e deixei alguém que não consigo lembrar a cargo da gravação daquela gritaria e bebidas.

 Conforme eles iam jogando, iam parando. Nenhum deles passara mal exceto eu. Mas naquele momento eu ainda estava sano e meus neurônios ainda estavam em funcionamento, porém prestes a entrar em colapso devido ao consumo excessivo de uma substância da qual meu organismo estava apenas conhecendo e queria que fosse eliminado. Ou seja, o álcool.

 Porém aquela altura em que todos já tinham feito uma pausa no jogo, ainda não tinha dado meia-noite. Ou tinha... ou eles pararam porque era novo ano. Enfim, não me lembro. A questão é: fizemos uma pausa durante o ano novo. E como eu disse, minha família toda é constituída por rockeiros e metaleiros meia-meia-meia, portanto, estávamos agradecidos que estava chovendo aquela noite. Pois com chuva, não haveria baile funk ao céu aberto como ocorre com frequência perto de onde moramos. Já que infelizmente moramos em um lugar cujo não merecíamos estar: rodeados de gentalha. E ironicamente, enquanto eu estava em estado vegetativo-alcoólico, os amigos do meu irmão foram dançar funk na esquina. Sim. A chuva havia cessado, eles não perderam a oportunidade. Ligaram o som e o batidão do funk carioca, e eles foram lá, ser esfregados pelas garotas que usam mini-saias como vestimenta principal no dia-a-dia.

 Portanto, antes disso, voltamos ao jogo Drinking Game. Não sei como todos eles aguentaram beber tanto. Entretanto, eles fizeram uma breve 2ª rodada, e continuaram a filmar. Só que quem estava filmando não era vós que escreve. Eu estava sentado entre dois jogadores, acompanhando de camarote toda a jogatina e, ágil como um rato, eu pegara um copo inutilizado e estava experimentando todas as bebidas disponíveis. Batida de maracujá, de limão... além do energético e o uísque. Só não tive coragem de beber o tal Sangue de Smurf, pois ninguém o havia bebido também. Sutilmente eu experimentava cada uma daquelas opções ali presentes, em cima da mesa. A minha humilde mente ilógica não parou para raciocinar o fato de que eu misturar distintas bebidas alcoólicas em um período de duas ou três horas dizimaria o funcionamento do meu impecável fígado e rins. Todavia naquele instante eu ainda estava parcialmente sano, pois me lembro o que aconteceu - afinal, se eu não lembrasse não teria como relatar isso tudo aqui. E foi aí que meu organismo entrou em alerta. O colapso estava iniciado. Agilidoso como o melhor anti-vírus atualmente disponível no mercado, meu cérebro rapidamente enviou mensagens para todo o corpo: "precisamos colocar essa merda toda pra fora!"

 Mas não foi imediato. Após tomar todas essas bebidas, eu ainda me levantei e continuei tomando copos de energético.

 Duas horas depois, às três horas do primeiro dia de 2012 aproximadamente, acordei deitado em minha cama, sem camisa. Primeira coisa que fiz foi imediatamente me perguntar em que planeta eu estava, colocar uma camisa nova e comer algo pra recompor meu pobre e danificado fígado. Peguei uma garrafa d'água, um pacote de bolacha Plugados de limão, e voltei ao local da festa. Alguns já haviam ido embora, outros continuavam lá. E meu pai, obviamente, continuava na churrasqueira.

 O que me lembro durante o meu total estado embriagado: que a cada gole em alguma bebida etílica que eu dava o namorado de minha prima ria incansavelmente de mim. E eu igualmente dava gargalhadas. Não lembro quando eles chegaram. Á essa altura eu sei que já estava fora de mim, não sei nem se falava sem abrir minhas traqueias para a entrada de oxigênio. Porém estava no ritmo das músicas que tocavam durante as primeiras horas do ano. E após isso, só me lembro de acordar, deitado no chão do banheiro, com a pia cheia de vômito e a torneira aberta. E apaguei novamente. Sim, vomitei na PIA. E segundo relatos, eu entupi a pia, e ainda por cima abri a torneira, e caí no chão, e assim, alaguei a cozinha praticamente inteira enquanto o resto dos presentes continuava jogando Drinking Game dos memes, até notarem a água espalhada pelo piso e circulando entre seus tênis. E acordei duas horas depois.

 Ainda estava bêbado, porém mais sano. Porém lembro que eu ainda estava embrigado o suficiente para fazer um moonwalk na cozinha, fingir que eu sabia tocar guitarra e falar ininterruptamente que eu gostava de torrone. Achei estranho o fato de eu me recuperar - não totalmente, mas ainda sim não estar mais totalmente bêbado - em apenas duas horas, e não ter dormido durante três dias seguidos. E ainda por cima ficar sem dor de cabeça. Todavia o pior ainda estava por vir.

 Desde que eu acordei depois de breves duas horas em coma, não consegui dormir. Fiquei até aproximadamente oito horas da manhã acordado, e acordei aproximadamente meia hora depois. E estava bem pior. Enjoado, me dirigi ao banheiro mais longe possível para gorfar. Ou esgurmitar. Em outras palavras, pra vomitar. Entrei no banheiro. E realizei todo aquele ato constrangedor e que só esperamos nunca mais passar por aquilo de novo e esperançosos pra que aquilo passe logo. Tornei-me a ficar de joelhos, abracei a privada, escutei seus conselhos e pus pra fora. Pela segunda vez. E isso me lembra o genial stand-up comedy do Bill Cosby onde ele fala sobre pessoas ficando bêbadas, aqui: http://youtu.be/DtANiauLprk

 Saí de lá, me deitei ao sofá. Ainda não me sentia bem, e voltei ao banheiro. Esgurmitei pela terceira vez, enquanto a privada continuava a falar carinhosamente comigo. E essa foi a pior. O esgurmito simplesmente parava na minha traqueia e eu tinha a certeza que poderia morrer ao melhor estilo Jimi Hendrix: engasgado com o próprio vômito.Voltei ao sofá, fraco, porém um pouco melhor. E não consegui dormir de novo. E tive que aguentar essa tortura. Esse pesadelo. Devido a não conseguir voltar repousar, me entregar à essa terrível humilhação. Tive que ser obrigado a assistir As Aventuras do Didi.

 Tentei comer um pão com vinagrete, tomar água... mas não descia. Aquilo parecia a pior coisa do mundo. O máximo que descia era eu mesmo ao me ajoelhar de tanto vomitar. Até que me ocorreu a brilhante ideia: sair do sofá e dormir em minha cama. Genial. Quem pensaria algo assim: ir para minha própria cama pra tentar dormir ao invés de ter que assistir e aguentar meu corpo gritar depois de uma piada do Didi. E entrei em estado vegetativo novamente. Só me lembro que dormi até as oito horas da noite.

 Meus pais brigaram comigo? Não. Só deram risada e me mandaram fazer isso e aquilo. Olha que bacana. E fui zoado devido a ter registros de uma foto e um vídeo de mim me flagrando enquanto eu bebia tudo desavergonhadamente na frente de todos.

 Coincidentemente, um dia após esse grande fato eu me deparei com um estudo que indicava que músicas pesadas e com batidas rápidas influenciavam mais as pessoas á beberem mais. Prefiro acreditar que o estudo está correto e que as músicas velozes me influenciaram a minha estréia no mundo da embriaguez. Somado isso ao fato de todo o clima festivo de ano novo, e o jogo Drinking Game e a grande variedade de bebidas, era inevitável. Fui fadado ao meu primeiro dano de fígado judiado pelo suco de cevada e por bebidas misturadas com mé.

 No entanto, cheguei a algumas conclusões: Álcool é igual rede social. Agrega as pessoas, mas se você não souber usar vai acabar passando vergonha. E você é julgado de acordo com o que você está bebendo em uma festa. Se você chega em um festa com desconhecidos e só bebe Fanta Uva, você não será visto como uma pessoa legal ou engraçada, pelo o menos para alguns. Generalização e meia-verdade, óbvio.

 Resultado: vômitos 3, ressaca 0. Sim, bebi pra caralho, vomitei três vezes e não fiquei com dor de cabeça. Pararei de beber? Não. O único que nunca farei de novo é beber cerveja, batida, uísque e energético no mesmo dia. 

 Fiquei nauseado todo o dia seguinte. E perdi 45 de life. Essa é minha vida bastarda e cheia de aventuras. Impressionante.


10/01/2012

O tio Pavê

 Todos nós temos pelo o menos algum parente, de preferência um tio, em nossa família, que é o responsável por fazer as piadas óbvias. Esse é o Tio Pavê. Tio Pavê é como eu chamo carinhosamente aqueles que fazem as piadinhas mais engraçadas, bombásticas e sacanageiras do nosso mundo globalizado. Tio Pavê é o tipo de pessoa que tenta ser como o tio realmente engraçado da família. Ou o que tenta ser um tio engraçado. Tio Pavê é o que se senta na mesa de almoço em família, e não hesita em fazer a famosa piada do Pavê ou pacomê. Tio Pavê é o que de melhor consegue fazer é causar algumas gargalhadas no sobrinho de oito anos.

 O Tio Pavê não exita em deixar a família inteira constrangida por fazer uma piada óbvia ou manjada demais. E por falar em manjada, o Tio Pavê é também aquele que diz "Não sei fazer manjar, mas a senhora deve manjá né?" A espécime mais previsível do planeta Terra.

 O Tio Pavê é o que em época de Natal, ao todos estarem na mesa, saboreando as maravilhas da cultura natalina, pergunta à sua esposa - com toda a sua originalidade, sarcasmo, criatividade, acidez, humor negro, ironia e ousadia para fazer piadas: "Você vai por o peru na boca?"

 Tios Pavê são extremamente rotineiros. Não há nenhum final de ano em que ele não fale "esse ano eu não bebo mais" ou "tomar banho só ano que vem". Ou pior ainda: quando em festas de ano novo, ao dar 00:00, ele dá o abraço, as felicitações e manda toda a sua originalidade para causar risos falsos e constrangidos: "Po, feliz ano novo cara, não te vejo desde o ano passado ein!"


  E falando em meia-noite, não há como evitar eventuais piadas que o Tio Pavê possa ou irá fazer. Exceto algumas poucas delas. Como por exemplo, ao estar você e ele em uma festa e já ter passado da meia-noite, quando tiveres indo embora, nunca se despeça do Tio Pavê dizendo que "vou ter que acordar cedo amanhã", porque involuntariamente seu instinto cômico-constrangedor irá retrucar "amanhã não, hoje, já passou da meia-noite" seguido de risadas infames. E por falar em risadas infames, são exatamente isso que torna as piadas mais constrangedoras ainda.

 Você não pode andar pela rua ou passear com um Tio Pavê. Porque hora ou outra ele vai dizer "Cuidado, você pisou! No chão!" e fazer suas típicas gargalhadas infames. Você não pode discutir com um Tio Pavê. Não pode ter argumentações sérias sobre assuntos sérios ou polêmicos sobre o Tio Pavê, ainda mais se você for gordo. Porque se você for gordo, ele não hesitará. Ele irá dizer "Eu acho que você está redondamente enganado".

 O Tio Pavê tem ótimas veias e inspirações cômicas. Suas qualidades como roteirista d'A Praça É Nossa são inegáveis. E em muitos casos são frustrados ou têm baixa auto-estima por não serem originais e criativos em suas piadas. Contraditoriamente, em alguns casos, eles são justamente os parentes mais felizes, satisfeitos com as suas situações econômicas e conjugais. Pelo o menos é o que aparenta. Tios Pavê faz uso do humor como uma válvula de escape para seu casamento infeliz com a tia gorda, de cabelo ruim que cheira à salmão estragado na feira e está com varizes.

 Tio Pavê é sempre aquele que nós esperamos que em todo churrasco ele faça as mesmas piadas para o churrasqueiro. Sim. É aquele que se aproxima e pergunta se dois quilos de linguiça dá pra vinte comer. É o que vai na padaria, na loja ou em qualquer outro estabelecimento e ao falar com o vendedor ou o atendente diz "Eu quero a Marba... a marbarata". Existem ainda tios pavê que se atrevem à fazer aquela piada que parou de ser engraçada em 1994: "Você pinta como eu pinto?". Que original. Meus parabéns.

 O Tio Pavê não tem idade. E não precisa ser necessariamente da sua família. Pode ser seu amigo. Pode ser aquele que ao você ligá-lo para confirmar se ele vai na pizarria e perguntar "como vai" ele indubitavelmente responderá "não como você mas gostaria". Pode ser seu companheiro, seu parceiro, seu colega de escola ou trabalho, sua mãe, seu pai, seu papagaio. Pode ser você.

noça engrassado p krl d+ mesmo essa piada ein lek
 Os Tios Pavê sofrem. Sofrem da Síndrome do Pavê. E qualquer um pode pegar essa doença, permanentemente ou temporariamente. Ou seja, você pode fazer piadas óbvias, sem graça e manjadas o tempo todo ou esporadicamente. Esses são o Tio Pavê. É como eu os carinhosamente nomeio.

04/01/2012

Testemunha de Jeová? NÃO!

Não achei nenhuma imagem legal e coloquei essa porque ela é gostosa.
 E também pra incentivá-lo a continuar a ler o texto, que é melhor que a Bíblia

 O que é exatamente estar de férias? Férias: estado de ação; É quando sua ociosidade, sua procrastinação e seu sedentarismo e começam a brilhar e entram em chamas, descontrolando todo o seu relógio biológico, fazendo-lhe dormir de 10 à 12 horas diárias. Isso se você for um abstêmio de vida social, é claro. O que é meu caso.

 Dizem que as pessoas passam em média um terço da vida delas dormindo. O que significa que elas dormem aproximadamente 8 horas por dia. Então, se eu durmo 12 horas por dia, passo metade da minha vida deitado sobre um colchão? Acho justo, afinal, como sou um completo desprovido de convívio humano, ainda mais nas minhas férias escolares, não faz diferença. E não importa o quão cedo eu vá dormir, aparentemente só consigo entrar em coma após as cinco horas da madrugada. Se eu não morresse por doze horas todos os dias, isso não seria um problema sério.

 E justamente neste dia normal cumprindo minha rotina, que era pra ser uma de minhas hibernações de inverno dignas de ursos polares, fui despertado de meu sono matinal, matutino, vespertino e noturno. O que era pra ser um dia normal pra ser cumprido meu horário normal de sono nas férias (o que no caso seria das 5:00 até às 15:00), fui interrompido de meus nobres sonhos. Fui acordado às 10 horas da manhã com barulhos no portão de minha residência.

 Quem era? Era o cobrador da luz? Da água? De IPTU? Da conta do bar? Do prostíbulo? Não. Abri a porta. Era uma testemunha de Jeová?! NÃO!

 Surpreendentemente, cheguei a conclusão de que o mundo decidiu conspirar à favor de novas tendências na moda nesse verão de 2012, renovando um pouco os valores dessa sociedade moderna. Ou seja, ao invés do cosmos me enviar uma velha testemunha de Jeová que pudesse me perguntar qual foi a pessoa mais importante que já viveu e eu responder com o meu maior senso de fanfarronice que foi o Goku ou o MacGyver; não. Não era nenhuma testemunha de Jeová. Que antes fosse.

 Me encaminhei com os olhos grudados de lágrimas ressecadas enquanto ajeitava desesperadamente meus pés em meus chinelos, e meu cérebro recém-ligado que não conseguia descobrir onde encontrava-se a chave. E além de tudo, meu desespero aumentava a medida que batiam mais na porta e eu não achava as benditas chaves. Minhas células e meus neurônios cerebrais não estavam totalmente eletrizados ainda, portanto decidi por desistir pela procura de tal objeto perdido e atender ao maldito desconhecido elemento que estava batendo em meu portão de casa às 10 da manhã exigindo minha presença, seja lá por quais eram seus motivos.

 Desci um pequeno par de degraus e me encaminhei ao portão. O abri. Estava destrancado. A minha persistência de procurar a chave tinha sido em vão. Enquanto eu abria a porta, meu cérebro e meus olhos parcialmente abertos que ainda estavam se conectando em minha recém despertada desesperada tentavam identificar em meio à luz do sol o que estava me fazendo acordar do conforto de minha cama. E avistei duas figuras. Dois corpos. Dois indivíduos, dois elementos. Duas pessoas. Duas mulheres. Mulheres femininas.

 Eram duas mulheres. Meus olhos ainda entreabertos e minha perspicácia deram uma rápida analisada na vestimenta de ambas as mulheres, que se vestiam e tinham fisionomia iguais. Tinham cabelos longos nas costas e usavam saias jeans. Ou seja: De fato, não era uma testemunha de Jeová. Eram DUAS evangélicas! Cheguei a rápida e irrefutável constatação diante disso: eram duas evangélicas prestes a me evangelizar! Não foi bem assim, ainda bem. Elas não estavam lá "diretamente" com o intuito de me evangelizar. Elas estavam lá com o intuito de "incentivar a leitura da Bíblia"... que tédio. Como um ateu, qualquer proselitismo  religioso já é uma encheção de testículos que um cético convicto não consegue engolir. Isso é tedioso. Mais chato do que um religioso fundamentalista tentando-lhe converter ou pregando a palavra á um ateu é duas evangélicas me acordando às dez da manhã para me incentivar a ler a Bíblia!

 Uma das evangélicas puxou uma bíblia de sua bolsa e habilidosamente abriu na página correto, no versículo correto, do parágrafo certo, da lei certa e sei lá no que mais do livro das leis divinas de Deus que eles supostamente cumprem. Não lembro o que ela disse, mas relacionava alguma coisa com Deus e o amor ao próximo, ou alguma falsidade do tipo. Obviamente latejavam em minha mente mil e uma respostas sarcásticas, sérias, debochadas, irônicas e engraçadas sob motivos variados simplesmente para ver a reação das tais senhoritas engajadas em seus projetos de incetivo ao livro sagrado. Poderia ter feito isso sem o menor remorso ou senso de vergonha. Mas não o fiz. Talvez por motivos de querer conter minha fanfarronice ou porque meu cérebro ainda não estava totalmente carregado por terem me despertado de manhã. E deveria o ter feito, afinal, esse post ficaria muito mais engraçado. Mas enquanto isso, aceitei normalmente a falação inútil da senhorita que desconhecia o fato de eu ser ateu.

 Eu poderia lhes ter ordenado que fossem embora imediatamente. Mas não se pode fazer essas coisas. Eu poderia tê-las avisado que eu era ateu, ou que eu já pertencia e seguia fielmente ao satanismo. Ou que era gay, afinal pra elas um gay é uma ameaça as "regras de Deus". Ou que eu já tinha minha religião e que acreditava em Odin, afinal ele é bem melhor.

 E porque o incentivo da leitura da Bíblia? As pessoas não gostam de ler livros grandes e chatos. E a Bíblia é exatamente isso. Por que não um livro mais legal como uma coletânea de crônicas do Luís Fernando Veríssimo ou do Arnaldo Jabor? Ou livros didáticos, que ensinem sobre placas tectônicas, as maravilhas culturais de Butão e a posição da Nova Zelândia que eu aposto que muita gente não saiba, ein? Ou até mesmo algo mais simples, como A História da Chapeuzinho Vermelho? Aposto que esses livros têm todos mais moral e mensagens éticas do que a Bíblia. E nenhum deles foi responsável por nenhuma guerra até agora.

 Enfim... só gostaria que vocês ficassem sabendo essa minha incrível aventura e desse fato que faz da minha rotineira vida agitada. Pelo o menos ainda não fui interrompido bruscamente de novo e continuo a cumprir meu horário de hibernação normalmente.